O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse hoje (13) que a retirada do embaixador venezuelano no Brasil, Manuel Vadell, para prestar esclarecimentos ao governo de Nicolás Maduro, não é definitiva. Vieira disse que o procedimento é comum na diplomacia.
“Ele [o embaixador] foi chamado para consultas. E quando ocorre isso é por um período”, disse. “Não ha indicação que a partida do embaixador seja definitiva”, completou o chanceler, que participou nesta quarta-feira (13) de audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados para tratar da Venezuela.
No dia 30 de outubro, a Venezuela convocou o seu embaixador no Brasil para consultas como manifestação de repúdio a declarações feitas por porta-vozes brasileiros, citando especificamente o assessor especial da Presidência da República, embaixador Celso Amorim.
“Ainda que as circunstâncias imponham uma inevitável diminuição do dinamismo do relacionamento bilateral, isso não significa de forma alguma que o Brasil deva romper relações ou algo dessa natureza com a Venezuela. Pelo contrário, diálogo e negociação e não isolamento são a chave para a construção de qualquer solução pacífica e duradoura na Venezuela”, avaliou.
O chanceler disse ainda que a crise política na Venezuela não deve ser resolvida com sanções e isolamento impostas de fora. Vieira defendeu que a resolução da crise no país vizinho, após a eleição presidencial do dia 28 de julho, que resultou na reeleição ao presidente Nicolás Maduro, seja resolvida através do diálogo pelos próprios venezuelanos.
“A solução precisa ser construída pelos próprios venezuelanos e não imposta de fora com mais sanções e isolamentos. Isso nós já vimos que não funciona. Não podemos cometer os erros que cometemos na época da autoproclamação de Juan Guaidó como presidente”, disse o ministro durante audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados para tratar da Venezuela.
Na avaliação do ministro, a relação com o país vizinho, que compartilha cerca de 2200 km de fronteiras terrestres, com o Brasil, a maior fronteira compartilhada depois da Bolívia e do Peru, foi esvaziada a partir de 2017.
Naquele ano, após 53 dias de protestos violentos, o presidente Nicolás Maduro convocou a eleição de uma assembleia constituinte que funcionou de forma paralela à Assembleia Nacional, o parlamento daquele país, então dominada pela oposição. A tensão política permaneceu no ano seguinte, com o boicote da oposição às eleições presidenciais de 2018, culminando com a autoproclamação de Guaidó, que presidia o parlamento, como presidente interino do país em 2019.
“Ao longo desse período, o governo brasileiro tinha outro direcionamento político e estimulou apenas um dos lados, em detrimento do diálogo”, avaliou Vieira, afirmando que, atualmente, a diplomacia brasileira tem como princípios a defesa da democracia, a não ingerência em assuntos internos e a resolução pacífica de controvérsias.
Aos deputados, Vieira lembrou que a defesa do diálogo já havia sido expressa pelo embaixador Celso Amorim, assessor especial da Presidência da República, em outra audiência no colegiado. Na ocasião, Amorim disse ser necessário que o Brasil permaneça como um interlocutor junto à Venezuela, apesar dos atritos diplomáticos ocorridos após a eleição presidencial.
Ainda de acordo com o ministro, o interesse do governo brasileiro sobre o processo eleitoral venezuelano decorre, entre outros fatores, da condição de testemunha dos Acordos de Barbados, para o qual o Brasil foi convidado, assim como para o acompanhamento do pleito de 28 de julho.
A eleição da Venezuela foi contestada pela oposição, por organismos internacionais e países, entre eles, o Brasil, pelo fato de os dados eleitorais por mesa de votação não terem sido apresentados.
No final de outubro, Venezuela acusou o Brasil de vetar a participação dela no Brics, que deve convidar 13 novos países como membros associados. A Venezuela, apesar de querer entrar no bloco, ficou de fora da nova lista, anunciada durante a 16ª cúpula do grupo, realizado em Kazan, na Rússia. O Itamaraty, no entanto, sustenta que o grupo apenas definiu os critérios e princípios para novas adesões.
Durante a audiência, o ministro também abordou o conflito no Oriente Médio, envolvendo Israel e o Hamas. Veira criticou os ataques do grupo terrorista Hamas que, em outubro do ano passado, mas disse que a reação de Israel é desproporcional. Os ataques do Hamas levaram à morte 1.163 pessoas e 251 foram tomadas como reféns, das quais, segundo o ministro, 100 pessoas ainda são mantidas em cativeiro.
“O que se assiste é uma reação desproporcional que busca ganhos geopolíticos concretos, que nada têm a ver com mera defesa nacional”, criticou. “O que começou como uma ação de terroristas contra civis israelenses inocentes tornou-se punição coletiva de todo o povo palestino com, indícios plausíveis de constituir a prática de genocídio, segundo decisão preliminar da Corte Internacional de Justiça”, afirmou.
Vieira disse que a reação israelense tornou a região de Gaza “um lugar inabitável” e lembrou que Israel já matou mais de 42 mil pessoas, das quais 70% são mulheres e crianças, além de promover incursões na Cisjordânia.
“Hoje Gaza é um lugar inabitável, 66% dos edifícios foram destruídos ou danificados; 85% de suas escolas foram destruídas e 96% de sua população passa fome, incluindo 50 mil crianças em situação de desnutrição aguda. Na Cisjordânia Israel passou a empregar, cada vez mais, a truculência utilizada em Gaza, com o número cada vez maior de assentamentos ilegais, condenados pelo direito internacional e pela comunidade internacional”, lamentou o chanceler que citou ainda a expansão da ofensiva israelense no Líbano, país que abriga a maior comunidade brasileira no Oriente Médio.
“Hoje já se contam 3.189 mortos no país, incluindo dois adolescentes brasileiros e um bebê de 14 meses que embarcaria no dia seguinte em um dos voos de repatriamento para o Brasil. Além disso, há 14.079 feridos e cerca de 1,2 milhão de pessoas deslocadas”, disse. “O Brasil alertava, desde o princípio, contra o risco do alastramento regional do conflito. Infelizmente, esse triste prognóstico se confirmou”, afirmou o ministro.
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