O Plenário do Senado aprovou, nesta terça-feira (4), o projeto que cria o Marco Regulatório do Fomento à Cultura, para organizar as regras das políticas de financiamento do setor na União, nos estados e nos municípios ( PL 3.905/2021 ). O texto, de iniciativa da ex-deputada Áurea Carolina (MG), já havia sido aprovado na Comissão de Educação e Cultura (CE) no último dia 21 de maio. Relatado pela senadora Teresa Leitão (PT-PE), o projeto segue agora para a sanção da Presidência da República.
O líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), lamentou o que chamou de questões identitárias do projeto. Segundo Marinho, o texto estabelece uma agenda que não leva em consideração o conjunto da sociedade brasileira. Além dele, também anunciaram voto contrário à proposta os senadores Eduardo Girão (Novo-CE), Cleitinho (Republicanos-MG), Styvenson Valentin (Podemos-RN) e Astronauta Marcos Pontes (PL-SP).
A relatora, no entanto, negou que o projeto tenha o objetivo criticado pela oposição. Ela disse que a matéria tem o mérito de ajudar a promover a riqueza da diversidade cultural do Brasil. Teresa ainda informou que acatou quatro emendas de redação para aprimorar o texto da proposta.
— O projeto fecha um ciclo virtuoso que começou com outros projetos de apoio à cultura. Agora vamos ter, de fato, o fomento acessível a toda cadeira da cultura — comemorou a relatora.
A senadora Zenaide Maia (PSD-RN) elogiou o projeto e afirmou que fomentar a cultura em todo o Brasil é uma medida importante, de forma destacada no Nordeste. Ela disse que a cultura brasileira é reconhecida em todo o mundo e parabenizou a autora e a relatora da matéria.
O presidente da Frente Parlamentar da Cultura, senador Chico Rodrigues (PSB-RR), também destacou a importância do projeto na “defesa cuidadosa” da cultura brasileira. Ele citou que, no mês de junho, é possível perceber um traço marcante da cultural nacional, que são as festas juninas.
— Tenho certeza de que os milhões de brasileiros que vivem da cultura estão imensamente agradecidos ao Senado — registrou o senador.
O projeto retira o setor da cultura da Nova Lei de Licitações ( Lei 14.133, de 2021 ). O texto, porém, mantém leis já existentes sobre o setor, como a Lei Rouanet ( Lei 8.313, de 1991 ), a Lei Cultura Viva ( Lei 13.018, de 2014 ), a Lei do Audiovisual ( Lei 8.685, de 1993 ) e as leis de fomento dos estados e municípios. Ao retirar a cultura da Nova Lei de Licitações, o texto permite que a União execute as políticas públicas de fomento cultural por meio de regimes próprios e outros estabelecidos em legislação específica, permitindo que Distrito Federal, estados e municípios também possam implementar suas políticas de forma autônoma.
O marco define cinco tipos de instrumentos jurídicos que podem ser utilizados de acordo com o objetivo da política de fomento. São três os instrumentos que contam com repasse de dinheiro público: Execução Cultural, Premiação Cultural e Bolsa Cultural. Sem repasse de recursos públicos, são dois instrumentos: Termo de Ocupação Cultural e Termo de Cooperação Cultural. Os recursos de financiamento poderão vir do orçamento público, de fundos públicos de políticas culturais, de recursos privados, de recursos complementares e de rendimentos obtidos durante a própria execução do evento cultural, entre outros.
Na modalidade Execução Cultural, as regras sobre despesas deverão ser compatíveis com a especificidade da cultura. O apoio poderá ser realizado por vários anos, quando necessário. A compra de bens será permitida e estes se tornarão propriedade do agente cultural. Também serão permitidos os gastos de manutenção (aluguel, contas etc) e o pagamento de encargos trabalhistas e previdenciários.
Ainda por essa modalidade, os elementos exigidos no teor das propostas deverão permitir a compreensão do objeto da ação cultural e da metodologia, sem obrigatoriedade de o proponente apresentar detalhamento de elementos que possam ser pactuados no momento de elaboração do plano de trabalho, em diálogo técnico entre o agente cultural e a administração pública, na fase de celebração. O objetivo é permitir mais flexibilidade à execução do projeto.
A estimativa de custos do plano de trabalho poderá apresentar valores divergentes daqueles praticados convencionalmente no mercado quando houver significativa excepcionalidade das ações. Serão consideradas variáveis territoriais e geográficas, bem como situações específicas tais como a de povos indígenas, ribeirinhos, atingidos por barragens ou comunidades quilombolas e tradicionais.
A modalidade Premiação Cultural reconhece a contribuição do agente cultural, sem exigir ação futura e demonstração financeira da aplicação dos recursos. A modalidade Bolsa Cultural incentiva ações de estudo e pesquisa por meio de bolsas. As atividades devem ser comprovadas por relatório de bolsista, sem necessidade de demonstração financeira. Nessas duas modalidades e na Execução Cultural, o edital de chamamento público é obrigatório, exceto em situações que ainda serão previstas em regulamento posterior.
O marco regulatório permite que os fundos de cultura de estados, Distrito Federal e municípios possam receber recursos do Fundo Nacional de Cultura (FNC) por meio da transferência de fundo a fundo. A intenção é evitar o uso de convênios para essas transferências — um procedimento de maior complexidade de execução. A União oferecerá apoio técnico para a promoção de políticas públicas de fomento cultural nos entes federados.
O projeto também cria procedimentos para captar recursos privados sem incentivo fiscal, o que pode fortalecer o financiamento da cultura. Ficam definidos os deveres do patrocinador para apoiar ações culturais e os retornos oferecidos pela ação cultural patrocinada. O projeto ainda permite que o agente cultural já apoiado por uma política pública de fomento busque recursos privados para fortalecer a ação cultural, por estratégias variadas, como venda de ingressos e campanha de financiamento coletivo.
São duas as modalidades que permitem contrapartidas do setor privado. A de Ocupação Cultural incentiva o uso de espaços culturais públicos, como teatros, museus, sem repasse de recursos, para atividades como feiras de artesanato, praças de alimentação de evento, lojas de festival e leilões de obras de arte.
A Ocupação Cultural pode ser realizada por meio de convites, por solicitação dos agentes ou por edital. Nessa modalidade, existe previsão da data de ocupação e lista de deveres de cuidado do agente cultural ocupante. O uso de espaços para a Ocupação Cultural pode ser feito gratuitamente ou mediante pagamento de taxa ou de contrapartida do agente cultural de fornecer bens ou serviços para a reforma ou manutenção do espaço, bem como a aquisição de móveis.
Já a modalidade de Cooperação Cultural deve promover ações de interesse recíproco entre governo e agente cultural, cujo escopo não se enquadra na hipótese de ocupação cultural, não envolve repasse de recursos pela administração pública e prevê compromissos das partes para o atingimento de sua finalidade. Um exemplo é o acesso a acervos culturais para pesquisa.
Como podem ser financiadas com dinheiro privado, essas modalidades (Ocupação Cultural e Cooperação Cultural) não necessitam de edital de chamamento público. As doações de pessoas físicas ou jurídicas poderão ocorrer por meio de plataformas virtuais de financiamento coletivo ou quaisquer outras ferramentas.
Em todas as hipóteses, a implementação do regime próprio de fomento à cultura deverá garantir plena liberdade para a expressão artística, intelectual, cultural e religiosa, respeitada a laicidade do Estado.
Em seu relatório, a senadora Teresa Leitão registra que o texto “representa um avanço significativo para o fomento à cultura no Brasil”. Para a relatora, ao estabelecer um marco regulatório claro e detalhado, o projeto promove a transparência, a eficiência e a democratização do acesso aos recursos culturais. “Sua abrangência, que inclui todos os níveis da administração pública, e a diversidade de instrumentos e fontes de financiamento, asseguram que as políticas culturais possam ser adaptadas às realidades locais e implementadas de forma eficaz”, complementa a senadora.
Teresa ainda acrescenta que o detalhamento do processo de chamamento público, a regulamentação da captação de recursos privados e as atividades de monitoramento e capacitação garantem que as políticas culturais sejam executadas de forma transparente, desburocratizada e eficiente. “O Marco é uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento cultural do Brasil, promovendo a valorização e o apoio a iniciativas culturais em todo o país”, destaca a relatora.
No mês de abril passado, virou lei um outro marco relacionado ao setor da cultura: o Sistema Nacional de Cultura ( Lei 14.835, de 2024 ). A lei decorre do PL 5.206/2023 , aprovado no Senado no último mês de março. O texto, apelidado de SUS da Cultura, é uma estratégia de gestão compartilhada entre União, estados e municípios, além da sociedade civil, para fortalecer as políticas públicas culturais no país. Os estados, o Distrito Federal e os municípios poderão elaborar regulamentos específicos para a execução do Marco ou optar pela aplicação de regulamento editado pela União ou por outro ente federativo.
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