O delegado Rivaldo Barbosa de Araújo Júnior negou diversas vezes, nesta segunda-feira (15), qualquer relação com os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, presos em março sob a acusação de serem os mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, em 2018.
Ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, Barbosa está preso sob a acusação de comprometer as investigações do assassinato. Ele prestou depoimento ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.
Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) é deputado e responde a processo no Conselho de Ética que pode levar à cassação do seu mandato por quebra de decoro.
Indicado como testemunha de defesa, Rivaldo Barbosa disse aos deputados que sua indicação para o cargo de chefia na Polícia Civil não foi influenciada pelos irmãos Brazão. Barbosa foi chefe de Polícia Civil durante as investigações do assassinato, de março a dezembro de 2018, tendo assumido o cargo dias antes das execuções.
“Desde o dia em que eu nasci, eu nunca falei com nenhum irmão Brazão. Eu nunca falei com essas pessoas na minha vida”, afirmou. “Eu estou aqui preso há quase quatro meses, e a única coisa que eu fiz foi indicar o delegado Giniton [Lages], que efetivamente prendeu com provas técnicas o Ronnie Lessa [assassino confesso da vereadora e de Anderson].”
Segundo Barbosa, a milícia é um “câncer no Rio de Janeiro”, que faz com que muitas pessoas sejam mortas, inclusive Marielle e Anderson. “Eu lutei muito contra essas milícias e hoje estou aqui em razão disso.”
O relatório da Polícia Federal aponta que a Delegacia de Homicídios, de Giniton, “não somente se absteve de promover diligências frutíferas para a investigação, mas também concorreu para a sabotagem do trabalho apuratório”. O texto revela, por exemplo, negligência da delegacia em recolher das imagens do veículo usado no crime.
Questionamento
O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) questionou Barbosa sobre ações da polícia que teriam dificultado as investigações. A delação de Ronnie Lessa aponta que Barbosa teria dado aval aos irmãos Brazão de que o crime ficaria impune.
“A gente viu que uma série de elementos necessários para investigação foram perdidos, foi tudo muito dificultado. O que é que o senhor diz a respeito disso, é uma tremenda invenção do réu, do assassino confesso?”, indagou Alencar.
“Com certeza absoluta. Eu nunca, na minha vida, faria qualquer coisa nesse sentido. O Ronnie Lessa foi preso por quem? Pelo delegado Giniton. Quem colocou ele lá, o delegado Rivaldo. Agora ele se volta contra quem? Contra quem efetivamente investigou [o crime]”, disse Barbosa. “Isso é uma mentira desse assassino, que foi preso pelo delegado que eu indiquei.”
Prisão preventiva
Detido pela Polícia Federal no dia 24 de março, juntamente com seu irmão Domingos Brazão, o deputado Chiquinho Brazão continua preso preventivamente no presídio federal de Campo Grande (MS). Na data dos crimes, o hoje deputado federal era vereador na capital fluminense.
Testemunhas de defesa
Outras duas testemunhas indicadas pela defesa de Brazão afirmaram ao Conselho de Ética que ficaram “surpresas” e “espantadas” ao tomar conhecimento da prisão do parlamentar como suposto mandante dos assassinatos.
Willian Coelho, vereador da Câmara Municipal do Rio há 12 anos, declarou que não há razões para ligar Chiquinho Brazão a grupos paramilitares no Rio de Janeiro. Em resposta à deputada Jack Rocha (PT-ES), relatora do processo que pode levar à cassação de Brazão por quebra de decoro parlamentar, Coelho afirmou que não acredita que o então vereador tenha colocado seu mandato a serviço desses grupos.
“Existir a milícia eu acho que é um fato notório. Agora, afirmar que esse tipo de organização criminosa influencia na política? Eu não acredito”, disse. “Ele [Brazão] sempre defendeu suas posições com muita educação e com muita delicadeza. Por isso que, sinceramente, eu fiquei espantado com a notícia do crime.”
Sobre a atuação de Brazão como vereador, incluindo a relação dele com Marielle Franco, Coelho disse que nunca presenciou nenhuma inimizade do vereador com ela ou com qualquer outro vereador.
“Marielle era uma vereadora muito respeitada, muito querida, defendia as suas posições com firmeza, mas também sempre de forma muito educada, e eu nunca presenciei nenhum tipo de problema ou desentendimento dele com a vereadora”, declarou.
Em resposta ao advogado de defesa Cléber Lopes, Coelho relatou ainda que participou da Comissão de Assuntos Urbanos no período em que Brazão presidiu o colegiado, mas negou que tenha sofrido qualquer tipo de pressão de grupos milicianos. “Nunca participei, nunca fui procurado por ninguém. O que existia ali era realmente o anseio das pessoas de bem que queriam regularizar seus imóveis”, concluiu Coelho.
Ex-deputado
Também ouvido como testemunha de defesa, o ex-deputado federal Paulo Sérgio Ramos Barboza, que já foi parlamentar pelo Psol e participou da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, disse que ficou surpreso com o suposto envolvimento dos irmãos Brazão no caso Marielle e Anderson. Ele defendeu que investigações sejam aprofundadas e que a presunção de inocência do deputado seja assegurada.
“Eu fiquei surpreso, porque houve idas e vindas na investigação em relação à tentativa de encontrar os mandantes, mas eu, a priori , pelo conhecimento que tenho e que tinha da realidade política no Rio de Janeiro e dos conflitos, fiquei muito surpreso e em uma tendência inicial de não acreditar”, afirmou.
A relatora questionou o ex-deputado sobre a relação dele com Chiquinho Brazão. “Eu estou aqui não é na defesa e na tentativa de dar uma contribuição para os esclarecimentos que vão ficando sepultados pelo massacre midiático”, disse Paulo Sério Barboza. Também em resposta à relatora, ele reconheceu que conviveu com os irmãos Brazão à época em que era deputado no Rio.
Para o ex-deputado, a Câmara deve assegurar o direito de Chiquinho Brazão à presunção de inocência. “Ela [Marielle] foi assassinada, é muito duro, mas o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados talvez tenha uma responsabilidade muito maior de exigir o cumprimento da Constituição, o devido processo legal, a presunção da inocência. É claro, em um caso clamoroso assim fica muito difícil enfrentar, muitos se acovardam”, concluiu.
Presidente do Conselho de Ética, o deputado Leur Lomanto Júnior (União-BA) reafirmou que Chiquinho Brazão será ouvido pelo conselho nesta terça-feira (16), juntamente com o irmão Domingos Brazão, com o conselheiro do Tribunal de Contas do RJ Thiago Kwiatkowski e com o ex-vereador Carlos Alberto Lavrado Cupello, conhecido como Tio Carlos (Solidariedade-RJ).
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