Durante depoimento do vice-presidente da Braskem, Marcelo de Oliveira Cerqueira, senadores da CPI concluíram que houve “exploração predatória” e o descumprimento, pela mineradora, do plano econômico de extração de sal-gema em Maceió. Para os membros da CPI da Braskem, que encerrou a fase de depoimentos nesta terça-feira (14), a empresa “retirou mais sal do que a capacidade de segurança dos poços”.
— A causa foi gerada pela Braskem e pela produção de minério, e só tem um motivo: tirar mais sal do que o permitido, tirar mais sal do que o plano de aproveitamento econômico da mina — constatou o relator, senador Rogério Carvalho (PT-SE).
O relatório final da CPI será apresentado pelo relator nesta quarta-feira (15), às 9h.
Apesar de ter sido beneficiado com um habeas corpus — concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques — e ter direito de permanecer em silêncio para não se autoincriminar, o vice-presidente da Braskem resolveu responder aos senadores. Ele contestou o relator ao sustentar que não houve extração superior ao projetado pela mineradora.
— Consultei também as equipes sobre a história da extração, e a informação que me foi passada é "não". O limite de extração foi respeitado durante o período da extração de sal — afirmou Cerqueira.
Os senadores ainda questionaram o depoente sobre cortes orçamentários. De acordo com Rogério Carvalho, dados encaminhados à CPI indicam que houve corte de R$ 52 milhões, entre 2015 e 2017, em investimentos na mina de sal-gema em Maceió.
— A Braskem informou a gente de que tinha um plano de investimento de R$ 53 milhões e de que foi investido R$ 1 milhão; R$ 52 milhões deixaram de ser investidos em 2015 e 2017. Essa informação eu não tirei da minha cabeça, nem tirei de documento secundário; essas informações foram retiradas de documentos encaminhados pela própria Braskem — citou o relator.
O gestor da Braskem disse não se lembrar de nenhum corte orçamentário que tenha sido feito relacionado à extração de sal-gema. Conforme o depoente, a segurança sempre foi tratada como uma diretriz inegociável, “e o investimento de segurança sempre foi priorizado na companhia”. Sem acesso aos dados em detalhes, comprometeu-se a encaminhar à CPI todas as informações sobre os investimentos relacionados à extração em Maceió.
Rogério Carvalho manifestou preocupação sobre como são feitos os estudos de viabilidade e monitoramento das extrações minerais no Brasil, já que, segundo ele, as mineradoras são responsáveis pelos próprios estudos. Para o senador, é comprometedor que todos os órgãos de fiscalização e monitoramento estejam sujeitos a dados secundários. Ele questionou o depoente sobre a razão de esses estudos terem sido adotados pela Braskem até 2023, causando, segundo ele, a demora da empresa em assumir que o desastre se dava em decorrência da atividade de mineração.
— Então, independentemente de ser no momento de crise de 2018 em diante, durante toda a existência do processo de mineração de sal-gema, era a própria mineradora que contratava os estudos e apresentava aos órgãos de controle. E a questão que nos chama a atenção é que a maioria desses órgãos — inclusive, teremos que dar um tratamento muito duro a esses órgãos — trabalhava com dados secundários. E a gente sabe que dados secundários têm que ter a ressalva — disse o relator, ao reconhecer que o Serviço Geológico do Brasil (SGB) foi a única instituição que conseguiu tornar pública a situação do território de Alagoas.
O vice-presidente da empresa respondeu que desconhecia qualquer informação de omissão e que a diretriz da diretoria, é de sempre atuar “com respeito às autoridades e à transparência nas informações”.
O relator quis saber o “que está por trás” da ação da Braskem de optar por comprar os imóveis deteriorados como forma de indenização e questionou se futuramente a mineradora teria interesse comercial na região.
“Na discussão com as autoridades, para que a Braskem pudesse trabalhar com segurança daquela região, fazer a demolição e todo o trabalho, o melhor arcabouço jurídico criado foi esse: em que a Braskem faria a compra na forma de indenização aos moradores e pudesse estar realizando aquele trabalho que os senhores tiveram a oportunidade de ver, ali na região dos bairros”.
Marcelo Cerqueira disse ainda que a mineradora vai respeitar “o espírito do acordo celebrado com as autoridades” de não utilizar aquela área para fins industriais ou comercial e que sempre respeitar o uso de interesse da comunidade de Maceió.
Os senadores Rodrigo Cunha (Podemos-AL) e Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI, pediram ao depoente que a Braskem reveja as ações impostas na Justiça e que impedem as famílias das áreas do Bom Parto, da Marquês de Abrantes e da Saem de serem inseridas no nível de risco 0.1 e tenham a opção de serem realocadas.
— Se no que a Braskem se baseia hoje são os dados técnicos, tem ali os maiores equipamentos de todo o planeta, o satélite japonês e o italiano, que demonstram que naquela região tem, sim, risco para as pessoas, e a Braskem assumiu o compromisso de que, nas áreas de monitoramento, dá opção, sim, de as pessoas serem realocadas, então, por que esticar essa corda? Por que fazer com que essas pessoas que não têm como chegar aonde eu estou hoje, olhar para o senhor e falar de maneira extremamente sensata: “Resolvam esse problema” — reforçou Rodrigo Cunha, dizendo que a questão já poderia ter sido resolvida pela empresa.
No entanto, Marcelo Cerqueira disse que o acordo de indenização para essas áreas, estabelecido com as autoridades, foi no sentido de atuar em iniciativas para eliminar o ilhamento social. Ele ainda informou que a orientação para oferecer “opção de realocação” para essas áreas precisa vir da própria Defesa Civil do município de Maceió.
— Não foi uma decisão só da Braskem, mas foi debatida, amplamente debatida com estas instâncias: o Ministério Público Federal da União, a Defensoria Pública da União, o Ministério Público do estado de Alagoas e o próprio município de Maceió. Nesse acordo, a gente continua trabalhando incessantemente para, até março de 2025, estarmos prontos para reavaliar se há necessidade de ações adicionais naquela região.
Rogério Carvalho fez referência a um estudo que chamou bastante atenção da CPI. Elaborado pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), o documento concluiu, segundo o senador, pela existência de abandono dos poços, se revertendo em minas inativas pela Braskem. Segundo o estudo, houve inclusive o desligamento das bombas de pressurização nas cavernas, em horários de bandeira vermelha da companhia elétrica, “com vistas a economizar”. o que teria provocado a despressurização e a fluência salina.
— Essas informações nos surpreendem a todos pelo nível de ação temerária e danosa, uma vez que, a essa altura dos trabalhos dados, já sabemos da importância de se manterem as cavidades pressurizadas e estáveis, pois esses processos de desligamento e despressurização seguidos por religamento das bombas causariam movimentação no interior do buraco, das cavas, e comprometeria toda a estrutura. Posso, então, dizer que as cavidades diversas, ativas e mesmo inativas, eram mesmo submetidas a um período de despressurização intencional para que se economizasse energia? — questionou.
O vice-presidente da Braskem reconheceu que a empresa promoveu racionamento de energia em 2001 e foi necessário, naquele período, porque houve um racionamento “generalizado no Brasil”.
— Então foi iniciada essa operação, foi analisada pelos técnicos da época. E não havia despressurização; as bombas eram desligadas por alguns momentos, e as bombas alimentavam apenas os poços que estavam em operação, já que as minas que estavam já desativadas teriam a pressurização própria, da própria estrutura geológica da região.
O relator questionou sobre a quantidade de funcionários na planta de extração de sal-gema e quais especialistas trabalhavam na extração. Segundo ele, documentos obtidos pela CPI comprovam que seriam de sete a 10 profissionais, mas “não havia geólogo contratado na atividade de mineração que era executada pela Braskem”. O depoente informou que o especialista foi contratado a partir de contrato terceirizado.
“A ideia era a gente ter especialistas com experiências diversas em outras regiões do mundo e que pudessem estar apoiando o responsável técnico pela mineração. Então era assim que era solicitado pelas equipes técnicas e foi procedido”.
No início da oitiva, o vice-presidente da empresa fez uma breve apresentação, manifestou “solidariedade irrestrita” a todos os moradores da cidade de Maceió em nome da Braskem e disse que a empresa assumiu a responsabilidade civil e ambiental em decorrência dos danos. Ele também fez um balanço das ações de recuperação e de indenização realizadas pela empresa até o momento.
Até dezembro de 2023, segundo o vice-presidente, 100% dos moradores das áreas indicadas pela defesa civil municipal para a desocupação já haviam sido realocados de maneira segura. Já em relação à compensação dos moradores, até abril deste ano, mais de 19 mil propostas foram apresentadas, mais de 18,7 mil foram aceitas e 18,3 mil foram pagas, representando 95% do total a ser indenizado, afirmou. Cerqueira disse ainda que R$ 360 milhões foram destinados a ações de investimento em mobilidade urbana e R$ 1,7 bilhão foi repassado ao município de Maceió como forma de indenização.
Antes do depoimento de Marcelo Cerqueira, a CPI inquiriu o engenheiro Paulo Roberto Cabral de Melo , responsável técnico pelas minas de exploração de sal-gema. Melo, porém, decidiu não responder aos questionamentos dos senadores. O engenheiro foi beneficiado com um habeas corpus (concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes) que garantiu-lhe o direito de permanecer em silêncio nas perguntas que pudessem incriminá-lo.
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